09 maio, 2020

"Tomai, comei, isto é o meu corpo". Hóstia transubstanciada: Ritual canibalístico ou o deus encarnado que não sabe que existe

Por Sandro Moraes

Enquanto comiam, Jesus pegou um pão, e, abençoando-o, o partiu e deu aos discípulos, dizendo: — Tomem, comam; isto é o meu corpo (Mateus 26.26 NAA).


"O Concílio de Trento resume a fé católica ao declarar: 'por ter Cristo, nosso Redentor, dito que aquilo que oferecia sob a espécie do pão era verdadeiramente o seu corpo', sempre se teve na Igreja esta convicção, que o santo Concílio declara novamente: pela consagração do pão e do vinho opera-se a mudança de toda a substância do pão na substância do Corpo de Cristo, nosso Senhor, e de toda a substância do vinho na substância do seu Sangue; esta mudança, a Igreja Católica denominou-a com acerto e exatidão de transubstanciação (Catecismo Católico, p. 380, #1376).


"...é possível ver quão apropriado e mais conveniente é o fato de que, em qualquer documento de importância onde há pontos obscuros, se busque nele mesmo seu próprio intérprete. Quanto à Bíblia, o procedimento sugerido não somente é conveniente e muito factível, mas também é absolutamente necessário e indispensável" (E. Lund). 
Parece ironia, mas é fato: o primeiro intérprete da palavra de Deus foi o diabo. No Éden ele falseou a verdade atribuindo à palavra divina um significado que ela não possuía. No ápice da tentação de Cristo no deserto, o príncipe negro mais uma vez alterou o sentido das Escrituras por meio da citação de uma parte que lhe era conveniente com a omissão de outra. De modo semelhante, mal-intencionados ou não, os mimetizadores do inimigo na esfera das religiões tem feito eco ao engano interpretando errônea e falsamente a palavra da verdade cujo efeito são grandes tragédias de natureza social, política e, pior, espiritual.


A violação dos princípios mais elementares e racionais de interpretação da Bíblia Sagrada levou os judeus à rejeitar a Cristo. Arrancando palavras, versículos e passagens de seus contextos, os romanistas caíram no erro do papado e seus abusos entre os quais a perseguição e morte de milhares de judeus e de milhões de verdadeiros cristãos no perpassar dos séculos, além dos numerosos erros de interpretação que resultaram nas doutrinas oficiais antiescriturísticas, produzindo incontáveis vítimas escravas do engano e de ficções. 


Kardecistas, russelistas, mormonistas e até comunistas conseguem encontrar nas Escrituras "fundamento" para os seus erros e blasfêmias. 


Feitas estas considerações iniciais, insistimos no retorno à correta interpretação da Bíblia como antídoto da queda nas falsas interpretações: A Bíblia explica a Bíblia, ou, a Bíblia é sua própria intérprete.


Fato? De fato, uma escancarada fraude

Marca distintiva do catolicismo, a doutrina da transubstanciação é um mito que narra haver nos sacerdotes o poder para recriar, de modo literal, nos altares católicos, o corpo de Cristo à partir da transformação dos elementos do pão e do vinho. O corpo de Cristo é, então, oferecido no sacrifício da missa ou eucaristia e mais uma vez é imolado, porém, de maneira incruenta, conforme diz uma das principais doutrinas oficiais do romanismo definida ainda em Trento, no que ficou conhecido como contrarreforma. 


Demonstramos em artigos anteriores que não há base lógica, racional ou bíblica para crer que o corpo glorificado e indestrutível de Cristo se converta em elementos destrutíveis, sejam eles consumidos durante a eucaristia ou não. Além de ser difícil sustentar a transubstanciação, já que os elementos da comunhão permanecem com aparência, cheiro e sabor de hóstia e vinho, esses elementos também não poderiam se transformar no corpo literal de Cristo antes da crucificação para ser novamente imolado; desde a ressurreição o corpo dele é imortal. 


Alegar que um milagre acontece quando o sacerdote consagra a hóstia também não ajuda, pois além de não haver nenhuma evidência de milagre durante a missa, é contrário ao modo normal de testemunhar os fatos, incluindo os miraculosos. O mesmo tipo de raciocínio aplicado pelos católicos para justificar a transformação das substâncias do pão e do vinho baseada na invisibilidade, na não percepção empírica, também poderia servir para validar a crença em Papai Noel ou Saci Pererê.


Literalismo versus simbolismo

Para sustentar o dogma da transubstanciação, a religião romana oferece ao fiel alguns versículos bíblicos como textos-prova e a exegese oficial católica. Há duas referências básicas: João 6.51-57 e Mateus 26.26-28. Essas passagens se constituiriam em consistentes provas da principal doutrina do catolicismo?


Vamos analisar essas passagens.


Eu sou o pão vivo que desceu do céu; se alguém comer deste pão, viverá eternamente. E o pão que eu darei pela vida do mundo é a minha carne.
Então os judeus começaram a discutir entre si, dizendo: — Como é que este pode nos dar a sua própria carne para comer?


Jesus respondeu: — Em verdade, em verdade lhes digo que, se vocês não comerem a carne do Filho do Homem e não beberem o seu sangue, não terão vida em vocês mesmos.


Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna, e eu o ressuscitarei no último dia.


Pois a minha carne é verdadeira comida, e o meu sangue é verdadeira bebida.


Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim, e eu permaneço nele.


Assim como o Pai, que vive, me enviou, e igualmente eu vivo por causa do Pai, também quem de mim se alimenta viverá por mim (João 6.51-57).


O catolicismo toma as palavras em destaque literalmente, ao passo que os protestantes as entendem simbolicamente. As condenações pela exegese aplicada são apontadas em ambas as direções. 



Seriam os católicos mais coerentes em seu entendimento dessa passagem que o protestantismo? Voltando alguns versículos atrás (v. 35), quando Cristo afirma ser "o pão da vida", seria o caso de entender que ele estaria afirmando ser um pão físico, um pão material? O que seria mais esquisito? Afirmar que Cristo é literalmente um pão ou que um pedaço de pão é Cristo?


Para obter as respostas adequadas é sempre recomendável voltar aos princípios elementares da exegese saudável: a Bíblia só deve ser interpretada de modo literal quando essa é a proposta clara do contexto em foco, do contrário, quando o literalismo violenta a lógica e torna irreconhecível o mandamento divino, o simbolismo deve ser levado em conta. A Escritura também possui linguagem figurada com suas nuances: metáfora, sinédoque, metonímia, prosopopeia, ironia, hipérbole, alegoria, fábula, enigma, tipo, símbolo, parábola. Não apenas algumas palavras têm emprego em sentido figurado nas Escrituras, mas também passagens inteiras, razão por que exigem interpretação apropriada.


No Salmo 91.4 que diz: "Ele o cobrirá com as suas penas, e, sob as suas asas, você estará seguro; a sua verdade é proteção e escudo", o salmista não está ensinando que Deus é um pássaro. À propósito, os salmos apresentam em profusão figuras de linguagem bastante expressivas. Deus sendo retratado como rocha é recorrente; em Provérbios Ele é uma torre; Quando o apóstolo Paulo exortou os crentes a deixar de tomar leite e consumir alimento sólido à semelhança do que ensinou o autor de Hebreus, a linguagem figurada foi escolhida para tornar mais viva a mensagem da necessidade de não ficar preso aos princípios mais elementares da palavra para avançar em direção aos ensinos mais complexos. Um modo eficiente de exortar para a maturidade cristã. 


Falando a Nicodemos sobre a necessidade espiritual do homem "nascer de novo", Cristo não estava sugerindo um retorno ao ventre materno ao pé da letra. Em João 4.10-14, ao dizer para uma mulher samaritana que é a "água viva" e uma fonte que jorraria de dentro dela, Jesus não estava afirmando ser algo como um rio físico. Estava tratando de verdades espirituais - assim como na passagem de João 6.51-57 em questão - ilustrando seus ensinos por meio de analogias familiares a todos.


Curioso os intérpretes católicos não entenderem algumas frases da Bíblia em sentido material. Isto ocorre, para exemplificar, quando Cristo chamou os fariseus de condutores cegos. Nenhum erudito católico iria concluir que os fariseus eram cegos no sentido físico. O mesmo vale para o momento quando Jesus chama Herodes de raposa. Também não creem num significado literal nas palavras "Eu sou a porta".  


As exemplificações apresentadas são suficientes para clarificar o que deveria ser o óbvio: é notório haver na linguagem bíblica palavras com significados muito variados, capazes de alterar o sentido das frases ou dos argumentos expressos. Para uma correta interpretação é indispensável verificar o pensamento especial que o autor propõe apresentar. Com esse procedimento é possível determinar o sentido pretendido da mensagem, e também se as palavras devem ser compreendidas em sentido literal ou figurado. Outra regra que ajuda a evitar erros de interpretação é deixar-se guiar pelo pensamento do autor e entender o sentido das palavras indicado pelo próprio contexto. Feitas essas observações, analisemos agora o segundo texto-base do dogma da transubstanciação. 


Comam; isto é o meu corpo. Canibalismo?

"Enquanto comiam, Jesus pegou um pão, e, abençoando-o, o partiu e deu aos discípulos, dizendo: — Tomem, comam; isto é o meu corpo" (Mateus 26.26). 


Pelo contexto, é evidente que a palavra "corpo" não pode ser tomada em sentido literal, como sugerem os estudiosos católico, e sim figurado. Essa conclusão é determinada pelo fato de Jesus, estando fisicamente inteiro, não ter partido o seu próprio corpo e sim o pedaço de pão que estava em suas mãos. O pão também não era uma extensão de seu corpo palpável. Jesus usa a palavra "corpo" em sentido figurado indicando que o pão em suas mãos representa simbolicamente o seu corpo. A percepção ao pé da letra dessa passagem, qual seja, a de que Jesus estariam segurando o seu próprio corpo, teria sido tão perturbador que os discípulos reagiriam ao absurdo, o oposto da reação natural apresentada.


É grave o erro do Catecismo Católico ao afirmar: "Encontram-se no cerne da celebração da Eucaristia o pão e o vinho, os quais, pelas palavras de Cristo e pela invocação do Espírito Santo, se tornam o Corpo e o Sangue de Cristo" (p. 367, #1333). Reincide no erro ao declarar: 


"A presença eucarística de Cristo começa no momento da consagração e dura também enquanto subsistirem as espécies eucarísticas. Cristo está presente inteiro em cada uma das espécies e inteiramente em cada uma das partes delas, de maneira que a fração do pão não divide o Cristo" (p. 380, #1377). 


Como vimos nas passagens de João 6.51-57 e Mateus 26.26-28, não há nada que ensine os crentes a tomar parte num ritual canibalístico; nenhuma atitude carnívora é minimamente sugerida. Se fosse esse o caso, os católicos jamais deveriam sentir fome ou sede físicas após comerem o corpo literal de Jesus com o seu sangue também literal. Mas é claro que continuam sentindo fome e sede literais porque "fome e sede" nessas mesmas passagens bíblicas são termos com significado espiritual, assim como "comer o corpo e beber o sangue de Jesus". 


Oposto ao ensino papista, o Nazareno ensina, mediante linguagem figurada, que os que nEle creem recebem a vida eterna uma única vez após depositar nEle a fé, sem necessidade de receber a vida eterna em parcelas pela participação em incontáveis missas escravizadoras. Esse ensino é consistente com o resto das Escrituras. A vida eterna é recebida pela fé em Jesus Cristo, e não comendo o seu corpo, como claramente Ele próprio ensina:


"De fato, a vontade de meu Pai é que todo aquele que vir o Filho e nele crer tenha a vida eterna..." João 6.40


Teoria fictícia ou o deus encarnado que desconhece a própria existência

Mais que uma peça ficcional, a doutrina da transubstanciação é um terrível engano. Se levássemos as implicações lógicas desse ensino às últimas consequências, descobriríamos complicações para a própria encarnação do Senhor Jesus Cristo. Vejamos.


Jesus encarnou em forma humana; desde a sua encarnação teve um só corpo. Sempre foi um ser humano, habitou continuadamente em um corpo humano. Se no momento em que disse "Isto é o meu corpo" realisticamente tivesse ocorrido a transubstanciação, então o Senhor passaria a ter naquela ocasião dois corpos. Mas isto é bizarro. O mesmo ser teria dois corpos diferentes, o mesmo ser habitaria dois lugares diferentes. Um dos corpos, porém, não teria consciência de sua divindade; não teria consciência de sua própria existência. A conclusão irresistível é: Jesus teria dado aquele pedaço de pão transformado em seu corpo dotado de alma e divindade, como os católicos creem, para os seus discípulos comerem, dando início a um ritual canibalesco. Os discípulos permaneceriam ao lado do Mestre cujo corpo acabaram de comer. Como é provável que Jesus participou da ceia, significaria que Ele teria engolido a Si próprio. Perturbador! 


Prosseguindo, durante a eucaristia a hóstia, corpo de Cristo com alma e divindade, perece no estômago ou estraga caso não seja engolido, posto que nem todas as hóstias são consumidas. Algumas sobram. Vem à memória o seguinte versículo: 


"prevendo isto, referiu-se à ressurreição de Cristo, que nem foi deixado na morte, nem o seu corpo experimentou corrupção (Atos 2.31).


Não está a passagem declarando que o corpo de Cristo não se corrompe? Um corpo de glória, imortal e indestrutível não pode ser comido.


Conclusão

A doutrina da substanciação é uma farsa. Dito isto, há uma escolha a ser feita, portanto, entre duas opções, ambas com consequências eternas:

  1. Crer na transubstanciação, doutrina da tradição católica que a Bíblia não ensina; ou
  2. Crer em Jesus para receber a vida eterna.

Desafio qualquer exegeta católico a refutar as teses consistentes deste artigo e dos demais desta série. Antecipo: missão impossível.


Acrescento que o Catecismo Católico, uma exposição dos dogmas oficiais do romanismo, apresenta dezenas de outras doutrinas e tradições da igreja católica, todas antibíblicas.


Aconselho o leitor, e exponho isto em amor, a abandonar a igreja católica e procurar uma igreja bíblica, genuinamente cristã, para se congregar, local onda a Palavra de Deus é apresentada como ela é, sem contorcionismos e torções.


Sabendo agora que você precisa colocar a sua fé em Jesus como a Bíblia ensina, e não comer o corpo de Deus como a igreja católica determina, não é mais possível alegar ignorância.


"Portanto, aquele que sabe que deve fazer o bem e não o faz, nisso está pecando" (Tiago 4.17).


Pense nisso! Repito, sua decisão terá consequências para a eternidade, com Deus ou sem Ele.


E aqui concluo minha séria de 4 artigos para refutar biblicamente o sacrifício da missa com o dogma católico da transubstanciação. 


Encerro a minha causa. Espero ter contribuído para clarear a sua mente na instrumentalidade do Senhor e soberano Deus. Cristo te liberte como a Verdade que Ele é, e nenhuma igreja é detentora exclusiva dessa Verdade. Tal alegação é desfiguração das Escrituras.


Em Cristo, Verdade única a libertar das falsas doutrinas.



10 de maio de 2020, São Luís-MA



BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA

A Mulher Montada na Besta: A Igreja Católica Romana e os últimos dias. Dave Hunt, Vol. 2, Actual Edições.


Bíblia Apologética. Almeida Corrigida Fiel, ICP


Inovações do Romanismo em Ordem Cronológica. Carlos H. Collete, Fiel.


Os Fatos Sobre o Catolicismo Romano: O quê a Igreja Católica Romana realmente crê. John Ankerberg; John Weldon, Chamada. 


Por Amor Aos Católicos Romanos: 37 Doutrinas da Igreja Católica claramente analisadas. Rick Jones, Chick Publications.


Resposta às Seitas. Norman Geisler; Ron Rhodes, CPAD.

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