05 setembro, 2017

A autocompreensão de Jesus: O Filho do Homem como reivindicação de sua divindade

Por Sandro Moraes

E disse Jesus: As raposas têm covis, e as aves do céu têm ninhos, mas o Filho do homem não tem onde reclinar a cabeça (Mateus 8.20).

Porque o Filho do homem veio buscar e salvar o que se havia perdido (Lucas 19.10).

Observar a forma como Jesus referia-se a si mesmo é fundamental para entendermos quem o nazareno acreditava ser. O título "Filho do Homem" ocorre cerca de setenta vezes nos Evangelhos sinóticos (Mateus, Marcos e Lucas) e doze vezes no Evangelho de João, todos em referência a Cristo. A expressão aparece apenas três vezes no Novo Testamento fora dos Evangelhos (At 7.56; Ap 1.13; 14.14). Era sem dúvida o título favorito de Jesus para indicar a si mesmo e um detalhe deve concentrar nossa atenção: Jesus era o único que usava esse título; outras pessoas o chamavam de Cristo, de Messias, de Filho de Deus, mas jamais de Filho do Homem. O que significaria essa expressão?

Uma compreensão teológica comum assevera que "Filho do Homem" significa que Jesus fazia uma mera reivindicação de humanidade, participava plenamente da natureza humana, porém sem cometer pecado (Hb 4.14-16; 7.26,67). Seria uma identificação semelhante à que é encontrada em mais de noventa vezes no livro de Ezequiel no Antigo Testamento
(no hebraico Ben Adam), descrição que naquele contexto significa "ser humano", e enfatiza a humanidade e fragilidade de Ezequiel, principalmente em razão da proximidade do profeta de uma visão da glória de Deus.

Um outro consenso acadêmico afirma que essa posição é equivocada. Para esses estudiosos a expressão "O Filho do Homem" teria outro significado teológico porque há uma diferença crucial entre a expressão usada por Ezequiel e a de Jesus de Nazaré: a presença do artigo definido. Diferente do profeta veterotestamentário, Jesus usava o artigo ho na expressão Ho Huios tou Anthropou (O Filho do Homem), o equivalente grego do hebraico Ben Adam (Filho do Homem). Jesus não se referia a si mesmo como "Filho do Homem", mas como "O" Filho do Homem. Ele não poderia estar se identificando como um simples ser humano como fazia Ezequiel. 


O uso do artigo definido por Jesus levou estudiosos a concluírem que o nazareno dirigia sua atenção para a figura escatológica divina em Daniel 7. A visão descrita impressiona:

Eu estava olhando nas minhas visões da noite, e eis que vinha nas nuvens do céu um como o filho do homem; e dirigiu-se ao ancião de dias, e o fizeram chegar até ele. E foi-lhe dado o domínio, e a honra, e o reino, para que todos os povos, nações e línguas o servissem; o seu domínio é um domínio eterno, que não passará, e o seu reino tal, que não será destruído (Daniel 7:13,14)
 
Nessa passagem "O Filho do Homem" vem nas nuvens do céu, uma imagem de um ser glorificado. Ele é levado à presença do juiz Todo-Poderoso (o Ancião), possui autoridade, glória e um reino que jamais será destruído; seu domínio é eterno e ele é adorado por todos os povos. Trata-se claramente de uma profecia messiânica que aguarda cumprimento num futuro escatológico. Essa figura divina será entronizada como governante de toda a terra, antes mal governada por quatro reinos dos homens conforme a narrativa de Daniel; será um reino indestrutível. 

No Evangelho de Marcos Jesus Cristo é a figura escatológica descrita em Daniel como "O Filho do Homem que virá sobre as nuvens do céu".

E, levantando-se o sumo sacerdote no Sinédrio, perguntou a Jesus, dizendo: Nada respondes? Que testificam estes contra ti? Mas ele calou-se, e nada respondeu. O sumo sacerdote lhe tornou a perguntar, e disse-lhe: És tu o Cristo, Filho do Deus Bendito? E Jesus disse-lhe: Eu o sou, e vereis o Filho do homem assentado à direita do poder de Deus, e vindo sobre as nuvens do céu. E o sumo sacerdote, rasgando as suas vestes, disse: Para que necessitamos de mais testemunhas? Vós ouvistes a blasfêmia; que vos parece? E todos o consideraram culpado de morte (Marcos 14.60-64). 

Aqui indubitavelmente Jesus afirma ser o Cristo, o Messias, o Filho de Deus, o Filho do Homem, a figura divina que se assentará à direita do Todo-Poderoso e virá sobre as nuvens do céu. A resposta foi claramente interpretada pelos membros do sinédrio que entenderam que Jesus afirmava ser O Filho do Homem do livro de Daniel que vem sobre as nuvens. Eles entenderam que Jesus afirmou ser igual a Deus, que ele quis roubar de Deus sua incomparabilidade ao se retratar como alguém que se sentará à direita de Deus e virá com as nuvens do céu. Já que eles viam a Jesus como simples homem, tal reivindicação de divindade foi equiparada à blasfêmia, cuja consequência era a pena de morte (Lv 24.16).

É também curioso que nessa narrativa do Evangelho de Marcos os títulos "Cristo" (Messias, no Hebraico) e "Filho de Deus", que não tem conotação de divindade (na crença judaica o Messias seria homem e não Deus), ganham essa interpretação na própria convicção que Jesus tem de si como O Filho do Homem. 

A autocompreensão de Jesus é que ele é a figura divina do livro de Daniel que se assentará à direita de Deus. A reivindicação de ser O Filho do Homem é, com efeito, uma reivindicação de divindade. O sumo sacerdote e o restante do sinédrio entenderam perfeitamente a alegação do nazareno. Mais uma vez Jesus ensinou algo novo sobre o messianato: o Messias não seria somente homem; Ele é Deus.


Sugestões de leitura

1 - Apologética Contemporânea: A veracidade da fé cristã - William Lane Craig.

2 - Quem criou Deus? E respostas a mais de 100 perguntas difíceis sobre questões de fé - Organizadores: Norman Geisler; Ravi Zacharias.

Um comentário:

Marcos disse...

Caro irmão,esse artigo com os textos usado analisado por uma mente judaica (que era a de Jesus e seus discípulos).E não helenista e com uma boa versão das escrituras;eu uso a versão TEB, que é uma versão do francês anterior a Almeida, que é cheia de variantes para induzir a doutrina de homens (pais da igreja com influências helenismo e seus concílios.A expressão Filho homem, é uma expressão semítica, filho de Adam, Adama,barro,solo vermelho, filho de Adão, Filho de homem; vai só confirmar que Jesus na sua origem e concepção era humano e não Divino e se vc usar uma boa versão para o texto de Daniel 7 e Ezequiel não existe o "artigo "O"filho do homem que vc colocou para diferenciar de ezequiel.o texto de Daniel também não fala de adoração ao filho do homem,mas em soberania sobre as nações realeza e glória, aliás essa expressão "glória" que vocês usam como base para tornar o Messias (Jesus)Divino não é exclusividade de divindade,mas tem o sentido de honra que pode ser usado para lugares, MT 4;8b todos os reinos e GLÓRIA deles.(pessoas humanas).Mt 6;29 Salomão em toda sua GLÓRIA,se vestiu.Jo.7;18 quem fala de si mesmo busca a sua própria GLÓRIA.Usar o termo GLÓRIA PARA justificar a DINVIDADE DE JESUS é furada. Quanto a citação de Mc 14;60,64.A revolta dos sacerdotes ali não é o fato de ele dizer ser filho do homem (filho de Adão).mas por Ele falar que iria destruir o templo em 3 días e se colocar como o Messias,o filho de Deus (uma promessa que está em ll Samuel 7 14 Deus diz, EU SEREI PARA ELE UM PAI,E ELE SERA PARA MIM UM FILHO 7;12 da tua descendência,Gerado por ti(do teu sêmen, semente)estabelecerei um trono real eterno.l Cr.28;6b pois Eu o ESCOLHI COMO filho e SEREI Para Ele um pai 7 prepararei o seu reino para sempre.A blasfêmia foi por se considerar o Messias e não por ser DIVINO o povo o via como humano.Jo. 9;11 O HOMEM a quem chamam JESUS.Jo.1;30 o batista fala, Após mim vem UM HOMEM que me procedeu.Jo 1;33 Eu não o conhecia? lCo.15;21 Porque assim como a morte veio por UM HOMEM (1*Adão) também a ressurreição dos mortos veio por UM HOMEM (2*Adão).
Para finalizar a citação de DN.7.13;14 filho do homem se concretiza nos "JUDEUS" SANTOS DO ALTÍSSIMO" QUE receberão a realeza da descendência do SÊMEN DE DAVID, saiu o Messias e não uma DIVINDADE.
A promessa é DIVINA e vem do Céu e se cumpre através de um judeu humano que no batismo do Jordão recebe a presença DIVINA,O VERBO,A PALAVRA, EMANAÇÃO, ESSÊNCIA, O ESPÍRITO SANTO PODER, LUZ,esse PODER trás a VIDA ETERNA A SALVAÇÃO A AÇÃO DO "ESPÍRITO SANTO".